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Em Inocência, sai o boi e entra a floresta de eucalipto

on qui, 17/08/2023 - 13:05
quinta-feira, 17 Agosto, 2023 - 13:00

A confirmação da chegada de uma gigante chilena para instalar uma fábrica de celulose em Inocência só acelerou um processo que já vinha se estabelecendo na cidade de 8,4 mil habitantes.

Fábrica ficará a 35km de Inocência, cidade que já sofre mudança de perfil com investimentos do setor da celulose (Foto: Assessoria Prefeitura)

O pequeno município, na região Leste de Mato Grosso do Sul, já vinha sentindo a substituição da pecuária pelo eucalipto para atender as fábricas Eldorado, de Três Lagoas e a Bracell, do interior paulista, mas agora viu disparar o interesse em substituir as propriedades rurais que eram utilizadas para criação de gado por plantações de florestas.

Nesta quinta-feira, a Arauco apresenta em audiência pública na cidade o Rima (Relatório de Impacto Ambiental) sobre o empreendimento, estimado em R$ 28,3 bilhões, para obter licenciamento, com previsão de início das obras em 2025.

A empresa mantém reuniões com lideranças locais para criar conexões. De início havia incerteza entre moradores se de fato o empreendimento se estabeleceria ali, mas hoje isso já é superado, comenta a presidente da Associação Comercial e Empresarial, Mariene Garcia de Freitas. Ela revela que já houve aumento de circulação de pessoas, empresários interessados em investir, em especial em setores como hotelaria, refeição e lavanderia.

Mas desde já se verifica um problema que seria natural e repete o que se verificou em Ribas do Pardo, onde está sendo instalada uma fábrica também de celulose, a Suzano. Há falta de imóveis e os preços inflacionaram. Na cidade e no campo, onde se tornou muito lucrativo arrendar terras para o cultivo do eucalipto.

Rejane Rocha Canevari, dona de uma imobiliária, conta que os preços de imóveis para locação chegaram a dobrar e no meio rural podem chegar ao triplo. Ela coloca anúncios de imóveis na internet e diz receber muitas consultas de pessoas interessadas em investir, já que a cidade dispõe de poucos prédios disponíveis.

Kitinets não ficam mais vazias, a rodoviária sempre tem movimento, muitos trabalhadores chegam para trabalhar nas florestas e em obras, há homens chegando do Norte e Nordeste do País em busca de oportunidades de emprego. Uma rede varejista de alimentos já está se instalando em Inocência, conforme a corretora.

Se por um lado Rejane constata que muitos proprietários rurais estão segurando seus imóveis em busca de valorização dos preços, o pecuarista Ivan Leal de Paula conta que dois vizinhos já abandonaram a atividade e arrendaram suas áreas. Ele reconhece que o arrendamento é bem vantajoso e tentador, mas vai permanecer criando gado em sua propriedade de 450 hectares.

Ele admite temor com preços baixos da carne, preocupação com mudanças na política econômica, mas diz pensar a longo prazo, em manter sua terra com pastagens. Releva temer o plantio de floresta e depois não ser fácil o solo voltar a receber pasto.

O lucro para o proprietário com o arrendamento da terra para florestas possibilita iniciar a pecuária em outra cidade da região com investimentos menores, como Camapuã e Figueirão, e ainda ter receita do que receber, analisa Rejane.

Leal de Paula aponta que o Sindicato Rural, do qual é secretário, não chegou a debater o assunto com os criadores. Conforme ele, proprietários de fazendas que não moravam na cidade, muitos do estado vizinho São Paulo, entregaram suas terras e já nem voltam mais. O fenômeno deve atingir cidades vizinhas, como Paranaíba, acredita.

Mariene conta que tem uma loja de produtos agropecuários. Ela já sentiu necessidade de reinventar o negócio, apostando em pequenos animais, uma vez que muitos pecuaristas foram embora e as vendas diminuíram. Para ela, um desafio é estimular o consumo local, porque, segundo revela, hoje 64% das pessoas compram produtos fora.

A dirigente lojista aponta que o Sebrae está em contato com os empresários, oferecendo suporte e divulgando as oportunidades que podem surgir. A própria Arauco fez parceria com o IEL para despertar potenciais fornecedores em cidades da região.

Comitiva de MS foi ao Chile em julho conhever unidade em Concepción e pôde fazer um paralelo sobre a mudança em Inocência. (Foto: Rede social)

Pensando adiante – Em entrevista no começo deste ano, o prefeito da cidade, Antônio Ângelo dos Santos, revelou a expectativa com o empreendimento, que deverá fazer a cidade saltar da 48ª para uma posição entre a 6ª e a 10ª economia do Estado.

Uma das consequências imediatas deve ser a elevação da média salarial, uma vez que os vencimentos pagos na indústria são mais altos. Conforme constou no Rima apresentado pela Arauco, Inocência tinha em 2021 a média de 1,9 salário-mínimo, enquanto a vizinha Três Lagoas, que já tem investimentos industriais, a média é de 2,9 salários mínimos por trabalhador.

No mês passado, o prefeito foi com o governador Eduardo Riedel e outras autoridades conhecer a fábrica que a Arauco instalou em Concepción, uma pequena cidade no Chile, e foi possível fazer um paralelo do impacto econômico e social que deve surgir em Inocência. Na ocasião, Riedel comentou que os moradores deverão ter calma, tranquilidade e foco durante a implantação, já que a cidade passará por uma transformação, para que “na maturidade do projeto a gente tenha a oportunidade de emprego e renda para o desenvolvimento de MS”.

Como a principal dirigente do setor empresarial na cidade, Mariene também aposta nisso. Ela espera que haja diversificação e ampliação de atividades, como a chegada de uma escola particular, aumento de serviços privados de saúde e novas opções de lazer para a comunidade. Ela também torce para que os funcionários com maiores cargos residam na cidade, para aumentar o consumo local.

Unidade de fábrica ficará na zona rural, entre Inocência e Água Clara (Reprodução Rima)

Canteiro de obras- A Arauco ainda está na fase de licenciamento ambiental para iniciar suas obras, mas a área já foi escolhida, a 35 quilômetros da cidade, rumo a Água Clara. Desde já a cidade vivencia empreendimentos relacionados à celulose. Na margem da BR-158, perto de onde fica o trevo de acesso à Inocência, há uma imensa obra da Suzano.

Ali está sendo construído um porto seco, um entreposto para a chegada da celulose que será produzida em Ribas do Rio Pardo e levada por caminhões para embarque em trem para seguir rumo ao porto de Santos. A empresa ainda não detalha o empreendimento, mas quem passa pela rodovia já verifica muitos caminhões e maquinário dando forma ao projeto.

O governo estadual também tem obras na região, para atender os empreendimentos que passaram a se ampliar na área leste do Estado, que passou a ser chamada Vale da Celulose.

A Prefeitura adquiriu uma área e a Secretaria de Infraestrutura e Logística vai construir um aeródromo, que está na fase de projeto executivo. Além disso, a pasta estadual informou que está sendo pavimentando o acesso da cidade à Costa Rica, passando por Chapadão do Sul, obra dividida em três fases, e acesso a Água Clara (MS-377), uma vez que a fábrica ficará entre as duas cidades. Hoje a ligação é via BR-158, que se encontra com a BR-262 logo após Água Clara.

Audiência pública- Na audiência desta noite, a Arauco vai detalhar como será sua fábrica, a alocação dos equipamentos, alojamentos dos funcionários, os impactos no meio ambiente com o processo industrial, como o uso e destinação final da água do Rio Sucuriú, e medidas para mitigação. Somente mais adiante deve divulgar compensações para a cidade, como parcerias com a Administração Pública para ampliar serviços à comunidade.

Conforme o Rima, na fase das obras, serão 12 mil pessoas trabalhando no auge;  com a empresa já instalada, a operação envolverá 1.070 empregos, próprios e de terceiros.

Para acompanhar a audiência pública desta noite, acesse o canal do Imasul.


Fonte: Campo Grande News