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Técnico do Boca já foi sete vezes carrasco de brasileiros
quarta-feira, 15 Maio, 2013 - 09:30
Quando entrar em campo no Pacaembu, nesta quarta, às 22h, o Corinthians encontrará pela frente o segundo clube mais vencedor da América e o camisa 10 que tirou o sono de nove entre dez torcedores que disputaram a Libertadores na última década. Na beira do gramado, ainda estará um senhor de 64 anos, com cabelos brancos, uma coleção de títulos e uma histórico impecável contra brasileiros, uma espécie de "doping" dos argentinos.
Carlos Arcecio Bianchi é o treinador mais vitorioso da história do futebol argentino e uma lenda em Vélez Sarsfield e Boca Juniors, os clubes pelos quais se destacou. Em sua carreira de quase trinta anos no banco de reservas, ele venceu quatro Libertadores, três Mundiais, sete Argentinos e derrubou brasileiros sete vezes no torneio mais importante do continente.
“Sempre me emociono quando entro no campo. Quando foi na final pelo Vélez, contra o São Paulo, tinha 99.199 torcedores. Mas são os 11 jogadores em campo que decidem a partida. Dá gosto jogar contra os brasileiros. São boas equipes e sempre temos de elevar a qualidade, o nível do jogo, pois o futebol brasileiro exige isso”, disse Carlos Bianchi na última terça, após o único treino do Boca no Brasil antes do confronto com o Corinthians.
Só em finais, foram três conquistas. Em 1994, o Vélez calou o Morumbi do então bicampeão São Paulo. Seis anos depois, foi o Palmeiras que não pôde comemorar o bi diante do Boca de Bianchi. Em 2003, a geração de Robinho e Diego perdeu sua chance de levantar a América ao cair contra o mesmo Boca na decisão.
As conquistas não serviram apenas para destroçar os sonhos verde-amarelos, mas também mudaram muita coisa na Argentina. A Libertadores de 1994 colocou o Vélez em um patamar inédito em sua história.
Bianchi, atacante formado no clube e campeão na década de 1960, ajudou o clube que defendeu desde a infância a adquirir status de grande. Foi a primeira conquista continental na história de um clube de bairro, que nunca teve grandes pretensões no disputado futebol argentino.
Com o Boca, a história é a mesma. Se hoje a Bombonera é o alçapão mais temido do continente e o clube é um dos maiores colecionadores de títulos, muito se deve a Bianchi.
Quando chegou à equipe “xeneize” pela primeira vez, em 1998, o Boca não ganhava nada há seis anos e só tinha duas Libertadores, conquistadas na década de 1970. O status de grande, àquela altura, se devia à força de sua torcida, desde sempre a maior da Argentina. O maior rival, no entanto, havia conquistado a América um ano antes e igualado o número de taças da equipe azul e amarela.
O Boca de Bianchi reescreveu essa história. Foram três títulos com o treinador, que repetiu o que havia feito com o Vélez e emprestou respeito ao clube que dirigiu. Foi a glória máxima do “Virrey”, apelido que recebeu por conta do Vice-rei (“Virrey, em espanhol) Liniers, que esteve no comando do Vice-reinado do Rio da Plata em 1800 e dá nome ao bairro onde o Vélez foi fundado.
Bianchi construiu sua história comunicando-se muito bem com seu público e demonstrando carinho com as torcidas que defendeu. O técnico é colunista da ESPN argentina há alguns anos e se dedica especialmente às análises do futebol europeu. Ocasionalmente, porém, deita seu olhar sobre os clubes de seu país, especialmente aqueles com os quais tem uma ligação mais próxima.
Em 2010, por exemplo, ele escreveu uma coluna emocionada sobre sua relação com o Vélez, relembrando os feitos que conquistou e agradecendo por ter contribuído com um “grão de areia” na história centenária do clube. Só que o Virrey também tem seus momentos explosivos.
Em 1994, ele viu a disputa de pênaltis que tirou o título da Libertadores do São Paulo do vestiário, por ter sido expulso no segundo tempo. Depois de ouvir os minutos finais no rádio, ele definiu os cobradores por entre as grades que o prendiam nos túneis do Morumbi. Dez anos antes, ele chegou a ser preso após um jogo contra o Huracán, no fim de sua carreira como atacante, depois de responder com gestos aos insultos da torcida rival.
Só que os momentos de destempero não tiram a objetividade de Bianchi, que chega a ser metódico na montagem de seus times. Em entrevistas e análises, ele sempre ressalta a importância de se ter um volante marcador e um centroavante goleador. Também dá, sempre que pode, suas alfinetadas na imprensa, crítico que é do relacionamento próximo entre jogadores e jornalistas.
A torcida sempre comprou suas brigas, até porque o técnico poucas vezes não satisfez seus súditos. Só pelo Boca ele soma duas eliminações diante do River. A primeira, em 2000, sedimentou o caminho para a primeira taça. Em 2004, o confronto decidido nos pênaltis foi uma das semifinais mais tensas da história da Libertadores.
Em 2004, quando deixou o cargo de técnico do Boca pela última vez, Bianchi se afastou dos gramados e consolidou-se como comentarista, a despeito dos entreveros constantes com repórteres. Na nova função, ele sempre negou qualquer chance de assumir a seleção argentina e seguiu à risca seu projeto de afastamento dos gramados, exceção feita a uma temporada à frente do Atlético de Madri em 2005.
O período de “folga” acabou em 2009, quando ele virou manager do Boca. O cargo diretivo representou seu primeiro grande momento de atrito com a torcida e a imprensa especializada. Irritado com as constantes especulações de que assumiria o time, ele abandonou as funções protestando contra os jornalistas e só voltaria ao clube no início desse ano, para sua quarta passagem pela Bombonera, desta vez de novo no comando técnico.
Hoje, porém, ele comanda o pior Boca da história do Campeonato Argentino, penúltimo colocado após 13 jogos. Na Libertadores, a equipe também nunca encantou e chegou a ser derrotado duas vezes na Bombonera. A eliminatória contra o Corinthians foi vista como a “última chance” do criticado elenco atual, que respondeu bem à pressão.
Com o 1 a 0 em casa, o Boca encostou o Corinthians na parede. As dúvidas sobre a fragilidade argentina, que dominaram as conversas antes da partida de ida, caíram por terra. Bianchi, novamente, é uma referência para os brasileiros, mesmo quando estes tentam exaltar suas próprias qualidades.
“A gente sabe que ele é vitorioso. Tite deu um exemplo muito bacana dele esses dias. Ele tem sim nosso respeito, mas a gente tem um treinador que é campeão brasileiro, um dos torneios mais disputados do mundo, campeão da Libertadores e do mundo. Se tem um treinador qualificado lá do outro lado, do lado do Corinthians também tem”, disse Emerson Sheik, na última terça.
Uol